Author Mauro Berimbau

Mestre em comunicação e consumo pela ESPM, com o tema "Advergames: comunicação e consumo de marcas". Lecionando na mesma instituição, pesquisa sobre jogos eletrônicos, entretenimento e marketing e mantém o laboratório de desenvolvimento e pesquisa lúdica GameLab ESPM. Fã e colecionador de videogames. Pesquisador nos campos de: ad-making, marketing, Cyber-cultura e games, especificamente a compreensão dos games como mídia.


A História dos Advergames


Não há como abordar os advergames sem lidar com um aspecto presente no senso comum quando se fala de jogos eletrônicos: há um pressuposto comum de que todo jogo eletrônico é voltado para crianças, ou para um público infanto-juvenil. Apesar de haver uma parte dos jogos voltada para este público, não há como afirmar que todos jogos eletrônicos são voltados para este ou aquele público e, por conseqüência, o mesmo vale para os advergames. Para compreendê-los enquanto estratégia de comunicação, evitou-se aqui orientar o olhar como se o conteúdo fosse voltado para um tipo de público em particular. Afinal, fazê-lo seria o mesmo que apontar que o meio “revista” ou “cinema” é exclusivo para este ou aquele público, quando, na verdade, os recortes de público consumidor variam mais conforme o conteúdo e menos conforme a mídia em si.

Feitas as devidas ponderações a respeito do olhar que este estudo tem sobre os advergames, apresenta-se a seguinte questão: Por ser um formato ainda no início de sua utilização pelo campo publicitário, seria hoje o advergame uma estratégia apenas utilizada para suprir certo desejo das marcas de acompanhar novidades e ocupar espaço, como aconteceu nos anos 1980 e ainda se percebe hoje?

Não há como negar que há jogos com essa característica, aparentemente feitos apenas para que se “participe da onda”. No entanto, os advergames bem construídos, geralmente componentes de uma estratégia publicitária maior, vêm a complementar de modo importante todo o conjunto de experiências de consumo de marca e, por isso, são acessados e divulgados por consumidores. É possível afirmar que o advergame teve seu “momento bolha” no início dos anos 1980 e que impactou negativamente, à época, a indústria dos videogames. Foi neste momento que surgiram os primeiros advergames, porém não exatamente como conhecemos hoje.

Breve histórico dos advergames

O console Magnavox Odyssey vinha com fichas, cartas e outros componentes. James Rolfe fez um vídeo da sua experiência com este videogame neste link

Foi ao longo dos anos 1970 que a indústria do videogame se consagrou como meio de entretenimento, com uma grande explosão de jogos eletrônicos e aparelhos surgindo nos anos seguintes, até chegarmos às cifras em vendas notadas hoje que ultrapassam as médias dos ganhos de Hollywood[1]. O primeiro aparelho lançado, o Magnavox Odyssey em 1972, não teve o sucesso esperado. A indústria do jogo eletrônico só entraria na casa dos milhões de dólares com o Atari 2600, lançado em 1977, seguido de tantos outros aparelhos semelhantes. Foi a partir daqui que o aparelho virou sonho de consumo, de modo que muitos lares americanos (e um pouco mais tarde, os brasileiros) possuíam algum videogame.

 

Os ganhos da indústria eram altos, mas não para os programadores de jogos, que observavam o enorme sucesso de suas produções sem receber nenhum tipo de reconhecimento por isso, nem financeiro, nem profissional. Na época, começaram a exigir que ao menos houvesse algum tipo de ganho de royalties, como ocorria na indústria do cinema ou da música, mas não eram atendidos. É neste contexto que, insatisfeitos com certas políticas da empresa em que trabalhavam, alguns dos programadores dos jogos da Atari se unem para formar uma softhouse que apenas produziria games, sem vínculo com a indústria produtora do hardware. Esta empresa foi nomeada Activision.

Nolan Bushnell, fundador da Atari, estava mais para um empreendedor do que um estudante de engenharia. Enquanto os gamedesigners e engenheiros dos anos 1970 rachavam suas cabeças para fazer jogos, Bushnell ficou famoso por saber comercializar o jogo eletrônico como forma de entretenimento, marcando então o nascimento de uma indústria

Esta iniciativa atrapalhava os negócios da Atari, que perdia exclusividade na venda de jogos para seus milhões de aparelhos espalhados por todo país. Por isso, a Atari moveu-se com o intuito de impedir as vendas da Activision, processando a empresa, mas não obteve sucesso. É a partir deste momento que ocorreu uma importante mudança no cenário industrial de games nos Estados Unidos que acabou por criar os primeiros advergames.

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Uma foto da equipe da Activision em 1980. Nesta foto estão os ex-programadores da Atari que fundaram a empresa – acima, da esq. p. dir.: David Crane, Larry Kaplan e Alan Miller. Na fila logo baixo, à direita, o quarto sócio-fundador-programador Bob Whitehead

Na época, por decisão judicial, permitiu-se que qualquer empresa produzisse jogos para qualquer aparelho de videogame. Isso fez com que o mercado fosse inundado de jogos de diversos tipos, muitos deles com uma qualidade baixa. Aliado ao barateamento e divulgação dos computadores pessoais, o que configurava um fortíssimo competidor para os videogames,muitos fabricantes de aparelhos na época viram suas vendas caírem drasticamente. Isso fez com que a produção de jogos eletrônicos se tornasse suficientemente barata. Além disso, na época, o game já se configurava como um elemento cultural suficientemente difundido, revelando uma série de programadores mirins que se dispunham a produzir games para pequenas empresas contratantes, surgindo assim os primeiros advergames.

pepsi-invaders

Um dos primeiros advergames da história, Pepsi Invaders, para Atari VCS

Neste período, não existiam jogos deste tipo voltados ao mercado brasileiro, já que não haviam aqui indústrias fabricantes de games ou de softwares que poderiam viabilizar algum tipo de negociação entre agência anunciante e desenvolvedora de programas.

O leitor pode se perguntar qual a importância de observar o histórico dos advergames nos Estados Unidos. Esse instante da história é menos importante por conta do lugar em que ocorre do que pelo cenário que ele apresenta, pois sugere que a publicidade já observava o jogo eletrônico como um potencial espaço para anúncio de produtos. Por estarmos num período que se buscava a diferenciação de ofertas principalmente através da comunicação, os games surgiram naquele instante como uma estratégia possível para se atingir este objetivo. No entanto, fatores como a popularização dos computadores pessoais, as diversas alterações nos meios de comunicação convencional, custos de produção etc. fizeram com que esta estratégia parecesse menos interessante do que outras possíveis, naquele instante.

Hoje, por conta da internet, sua rápida expansão e os diversos benefícios em custos de produção e distribuição de conteúdo que isso gera, bem como a própria evolução dos hardwares e softwares que permitem cada vez mais possibilidades com menos trabalho para programadores, os advergames estão se tornando estratégias cada vez mais relevantes dentro das campanhas publicitárias. No entanto, as relações entre a publicidade os conteúdos no ciberespaço (dadas suas próprias características) fazem com que quaisquer cruzamentos semelhantes sejam nomeados deadvergames, como alguns banners interativos ou de certos websites mais animados.  Mas mais importante do que estudar tecnicamente o advergame para formatarmos uma definição é estudá-lo como um tipo de jogo que tem o objetivo de comunicar algo para seu jogador, utilizando o entretenimento como meio, e não como fim.

Texto baseado em BERIMBAU, Mauro. Advergames: Comunicação e consumo de marcas, 2010. 136 f. Dissertação (Mestrado em Comunicação e Práticas de Consumo) – PPGCOM ESPM, Escola Superior de Propaganda e Marketing, São Paulo

[1] Cf. Steven MALLIET, Gust de MEYER. The history of vídeo game. In: Joost RAESSENS, Jeffrey GOLDSTEIN. Handbook of computer game studies. P. 23 a 45.

Fonte: www.mauroberimbau.com.br


OS 11 Jogos de maior faturamento da História dos Games


A indústria de videogames é um negócio sério. Analistas estimam que a indústria de videogames terá um faturamento maior do que US$100 bilhões em vendas ao longo de 2015.

Estes são os jogos de maior venda de todos os tempos, usando os dados mais recentes disponíveis a partir do Video Game Sales Wiki e Encylopedia Gamia, ajustado para a inflação em 2015.

11. Série Westward Journey (PC, 2001) – US$ 3,9 bilhões

 11 westward journey

Uma série de jogos tipo RPG on-line desconhecido no ocidente, mas um enorme sucesso na China. A desenvolvedora NetEase diz que soma 310 milhões de usuários ao longo da série.

10. Dungeon Fighter Online (PC, 2005) – US$ 4 bilhões

10 Dungeon Fighter onlineUm beat-em-up coreano on-line que nunca pegou nos EUA. Mas na Coreia do Sul é popular o suficiente para ainda ser jogado em campeonatos.

9. Donkey Kong (Arcade / NES / Coleco, 1981) – US$ 4,4 bilhões

09 donkey kong arcade

O Donkey Kong da Nintendo foi a primeira aparição do Mario (onde era conhecido ainda como Jumpman) e um dos maiores sucessos da empresa.

8. Wii Fit (Wii, 2007) – US$ 5 bilhões

08 Wii FitO jogo marcante do Nintendo Wii que estimulava pessoas a se exercitarem em suas salas de estar.

7. Lineage série (PC, 1998) – US$ 5,7 bilhões

07 lineage seriesOutro RPG on-line vindo da Coréia do Sul, desenvolvida pela NCSoft e jogada por 14 milhões de usuários. O dinheiro vem de compras opcionais dentro do jogo.

6. Wii Sports (Wii, 2006) – US$ 6 bilhões

06 wii sportsWii Sports acompanhava o console original Nintendo Wii e, por isso, tornou-se um sinônimo do sistema com seus controladores de rastreamento de movimento.

5. CrossFire (PC, 2007) – US$ 6,8 bilhões

05 cross fireUm shooter on-line tático free-to-play da desenvolvedora coreana SmileGate, com mais de 50 milhões de jogadores de todo o mundo.

4. World of Warcraft (PC, 2004) – US$ 8,5 bilhões

04 world of warcraftMais um online multiplayer que permite que você jogue com os personagens do universo Warcraft. É o jogo on-line mais lucrativo de todos os tempos, rendendo à Blizzard um nome reconhecido e uma empresa de bilhões de dólares.

3. Street Fighter II (Arcade / SNES / Genesis, 1991) – US$ 10,6 bilhões

03 street fighter IIO jogo de luta da Capcom que geraria uma franquia enorme, até chegarmos em “Street Fighter V” como um dos lançamentos mais aguardados de 2016.

2. Pac-Man (Arcade / consoles / mobile / PC, 1980) – US$ 12,8 bilhões

02 Pac Man arcadePac-Man ainda está em campo: Seu novo jogo, Pac-Man 256, foi desenvolvido pela mesma equipe por trás de Crossy Road. Também fez uma aparição no ano passado (2014) em Super Smash Bros para Wii U e 3DS.

1. Space Invaders (Arcade / Atari 2600) – US$ 13,9 bilhões

01 Space InvadersSpace Invaders da Taito não foi o primeiro jogo de videogame, mas tornou-se um fenômeno global. Lendas urbanas rezam que o arcade, no Japão, foi responsável por uma escassez de moedas no mercado em seu lançamento. Até hoje, esses pequenos alienígenas são ícones da cultura pop.

Meus comentários:

Achei muito interessante que:

1) Os coreanos estão com a bola toda. Jogos massivos online e competições de jogos de estratégia e tiro são mais que entretenimento na terra do kimchi. Trata-se lá de um e-sport. Muita gente leva a atividade à sério, diferente de nós, ocidentais, que ainda reagimos com risadas em rede nacional sobre a atividade. Estou estudando sobre e-sports e publicarei mais progressos por aqui em breve.

2) MMORPGs são serviços que exigem muito investimento, mas rendem um bom dinheiro. Mas não basta um bom game. Suponho que seja preciso muito investimento em comunicação para que o jogo “pegue”.

3) É realmente impressionante que Street Fighter, Pac Man e Space Invaders sejam os três primeiros. Se hoje somos bilhões de jogadores digitais com acesso a games por aparelhos que carregamos no bolso, em suas épocas éramos apenas uma fração desse valor, com acesso restrito nas casas de jogos digitais (os Arcades nos EUA ou os Fliperamas no Brasil). Atingir essas cifras marca a conquista de publicadores inteligentes e game designers brilhantes, que conseguiram atrair a atenção de muita gente com uns poucos kbytes em um território até então desconhecido.

Tradução livre minha de: www.businessinsider.com
Fonte: www.mauroberimbau.com.br


Games que irão lhe ajudar a se Tornar um Top Chef na Cozinha!


São diversos os jogos disponíveis que permitem ao jogador simular uma experiência na cozinha, seja elaborando os mais diversos pratos ou gerenciando seu próprio restaurante, em níveis variados de fidelidade da simulação.

Enquanto uns jogos se limitam a decorar bolos apertando três botões coloridos ao tentar determinar o confeito correto, outros exigem a correta decoração do ambiente, gestão da matéria prima, precificação e cuidado com comunicação, administrado através de uma série de menus. Alguns, mais raros, dão enfoque às celebridades. De qualquer modo, eles procuram simular uma experiência simbólica do que se entende por gastronomia. 

Em Restaurant City (Playfish, 2009) era possível criar todo o layout do restaurante com diferentes opções de mesas, cadeiras, balcões e até mesmo banheiros para que seus amigos jogadores pudessem visitá-lo – o que motivava um cuidado com decoração que melhor identificasse seu gestor digital. Com enfoque na variedade de pratos, sendo muitos étnicos (Ásia, Estados Unidos, Mediterrâneo, Latino etc.), o jogador ainda tinha que decidir qual deles servir – mais uma forma de expressão dos gostos do jogador. Não por acaso o jogo estava disponível no Facebook, e dava enfoque do jogo era a socialização com outros jogadores. Outros aparelhos mobile possuem títulos como Restaurant Story (TeamLava Games, 2014) e Bakery Story (TeamLava Games, 2014) que seguem a mesma linha do Restaurant City.


Cooking Dash [IOS][Android] (PlayFirst, 2014), Streetfood Tycoon [IOS][Android] (Kuyi Mobile, 2014), Happy Chef [IOS][Android] (Nordcurrent, 2014) ou Hello Kitty Cafe [IOS][Android] (Sanrio Digital, 2014) trazem como objetivo montar o prato rapidamente e servi-lo antes que o cliente se irrite e vá embora, o que implica em gerenciar os pedidos dos clientes e mantê-los no restaurante, trazendo menos ênfase nos tipos de pratos e ingredientes mas destacando uma espécie de simulação do serviço ideal. Lemonade Tycoon [IOS] (Hexacto, Jamdat, 2002) também sugere habilidades gerenciais, o que implica em selecionar a quantidade diária de ingredientes e recursos como copos, caixas, etc.; se atentar ao clima; contratar e reter os funcionários; criar campanhas de marketing; comprar equipamentos melhores, etc.


Order Up!! [IOS][Android][Consoles] (SuperVillain Studios, 2014) se concentra em simular as ações do cozinheiro: controlar o estoque de ingredientes, conhecer os segredos especiais de alguns clientes, preparar os pratos (as ações incluem: cortar, fatiar, triturar, fritar, cozinhar, saltear, assar e chapear) além de servir a refeição em tempo hábil, ou seja, antes de esfriar. De certo modo, Cooking Mama [IOS][Android](Office Create, 2006) é outro título que dá enfoque à cozinha – não na do restaurante, mas na caseira, dos pratos mais simples até os mais sofisticados.


Nem sempre se trata de cozinhar, administrar e decorar. Pode-se simular uma vivência com um grand chef du cuisine, administrador ideal, famoso e artista. O jogo What’s cooking? With Jamie Oliver (Atari, 2008), permite ao jogador cozinhar algumas das receitas da celebridade enquanto ouve suas dicas e explicações, onde estar com Oliver de algum modo parece mais importante do que aprender as suas dicas nesse livro culinário interativo. O objeto de consumo não é apenas a sua gastronomia idealizada, mas a própria identidade da celebridade.


Os games permitem que o jogador assimile determinados valores em uma metodologia ativa de aprendizagem, desta forma os “jogos de comida” podem preencher uma lacuna para aqueles que querem usar seu tempo de lazer em experiências imersivas de consumo simbólico, seja na cozinha caseira, na administração do restaurante ou na simulação da vida do chef-celebridade.


A importância Cultural e Econômica dos Games em nossa sociedade


Dentro da robusta indústria do entretenimento uma das áreas que apresenta maior crescimento atualmente é o setor de games; afinal de contas, este se consolidou como objeto cultural e importante pilar dessa indústria, atraindo a atenção da mídia devido às dimensões de lucratividade que alcançou com seus produtos.

pacman-live-at-GameCity-2-008Segundo um relatório da Statista, instituto estadunidense de estatísticas e estudos de negócios, a indústria de games em 2012 montava de um faturamento absoluto de $78,87 bilhões de dólares e este número, para 2015, está estimado para chegar em valores próximos a $111,06 bilhões de dólares. Já um outro estudo realizado pelo instituto Newzoo mostra uma projeção um pouco menos grandiosa e aponta que o mercado mundial de games em 2017 será de $107 bilhões de dólares.

Porém, longe de entrarmos em questões ligadas ao âmbito da economia, esta parte inicial de nosso texto busca situar a indústria de games como um campo relevante para estudos de comunicação e consumo dado o crescimento contínuo que vemos ano a ano para este ambiente. Um aspecto essencial a ser debatido aqui é o fato de que, mais do que produtos da indústria do entretenimento, os games se transformaram em mídia e sobre esse assunto confira a opinião de alguns autores famoses

Roger Silverstone, autor do livro “Porque estudar a mídia” (2002, p.14)
“a mídia agora é parte da textura geral da experiência”.

Fátima Regis, autora do livro “Dicionário de Comunicação” (2014, p.278)
“importância cultural e econômica dos games cresce na mesma proporção em que seus públicos se expandem e diversificam” e que portanto os video games “tornaram-se, assim, um potente meio de comunicação, interação e sociabilidade na cultura contemporânea”.

No atual cenário em que vivemos, os games também são mercadorias e podem ser estrategicamente moldadas para serem fatores de diferenciação social e transmissores de mensagens. Como afirma Don Slater em seu livro “Cultura do consumo & modernidade” (2002, p. 131), todo consumo é cultural e sempre envolve significado e experiência.

Mas afinal quão presentes estão os games na nossa cultura?


Videogames: A “brincadeira” que se transformou na mais robusta indústria do entretenimento


Os videogames começaram no mundo nos anos 1970, mas chegaram com força no Brasil em outubro de 1983 com a chegada do Atari 2600 pela Polyvox, conhecido por aqui apenas como “o Atari, da Atari” – expressão reforçada, na época, pela agência DPZ em uma campanha milionária tínhamos muitos aparelhos sendo produzidos no território nacional através de marcas próprias, mas foi naquele dia das crianças que o setor se posicionou, com clareza, para o público infantil.

Relembre este clássico:

Desde então, o mercado consumidor de aparelhos de videogame, bem como seus jogos, ficou marcado como um produto infantil e adolescente, e tantas foram as discussões acadêmicas sobre impacto negativo desse hábito na saúde e na educação.

Hoje, trata-se de um preconceito comum, presente na mídia, na academia e no nosso cotidiano, que imagina a atividade restrita aos jovens adolescentes ociosos que são supostamente estimulados a atos de violência e perversidade.

videogames-para-todos-marketing-gamesApesar dessa imagem ainda perdurar, os números atuais mostram que essa “brincadeira” se transformou em uma robusta indústria da contemporaneidade (superando o faturamento do mercado de Música e Cinema juntos), atingindo adultos e crianças, homens e mulheres, indistintamente. As diferentes linguagens advindas dos games se proliferaram e, hoje, é possível jogar nas mais variadas interfaces e plataformas.

No contexto contemporâneo, perante esta enorme gama de possibilidades, a ideia de entretenimento relacionada aos games ganhou o aspecto de ser anytime/anywhere. Tal disseminação de conteúdo, inclusive, levou os games e sua linguagem para esferas que extrapolam o âmbito do mero entretenimento.

Hoje, é possível encontrar jogos aplicados estrategicamente em novos negócios, treinamento empresarial, saúde, educação, política e tantas outras. Estas searas se aproveitam de jogos completos ou apenas de aspectos lúdicos pontuais para transmitirem determinadas mensagens e engajarem suas audiências.

Será que nos dias atuais alguém ainda considera os games brincadeira de criança?

Player 1: Msc. Mauro Miguel Rodrigues Berimbau
Player 2: MsC. Vicente Martin Mastrocola


Para Gamificar, não basta maquiar!


Como um pesquisador de games e professor, já desejei fazer alguns experimentos em sala de aula com gamificação. Por isso, comecei minha jornada fazendo cursos online e comprei alguns livros que tratam o assunto diretamente.

Os livros ajudaram, em parte. O problema é que, ao comparar a maioria daqueles discursos com as teorias de game design, não parecem que as propostas de gamificação na sala de aula estão acertando a mão com seus alunos. Afinal, como já discutido, gamificar não é substituir o nome de “prova” por “chefão”, fingindo que a aula tradicional de física, a partir de agora, é um jogo legal. Não será. Vai ser visto como uma aula mal travestida de videogame, e talvez gere mais desconforto dos alunos do que a desejada participação.

É nesse sentido que critico a proposta da empresa Playdea. Com a boa intenção de promover novas estratégias para melhorar os resultados nas salas de aula, tem uma proposta muito semelhante a essa maquiagem falsa do conteúdo escolar.

Antes de começar qualquer crítica, um reconhecimento. Existe a possibilidade de que eu esteja muito errado ao criticar a Playdea, pois não conversei com ninguém da empresa, construindo minhas percepções realizadas através de um documento explicativo publicado por eles mesmos e através da minha experiência através de sua plataforma em modo trial, com acesso limitado. Ao mesmo tempo, procuro reconhecer a excelente proposta de sistematização e digitalização do sistema tradicional de ensino, com todos os benefícios que isso pode trazer para professores e alunos.

Abaixo, segmentos do texto explicativo da empresa sobre o que é gamificar, e minhas ponderações:


Concordo

– Educação alheia à tecnologia

A academia, de maneira geral, é bastante tradicional. Instaurou-se o método de ensino padrão no formato de aula expositiva com exercícios baseados em perguntas e respostas, trabalhos documentados em texto e avaliações nos mesmos formatos, e não é tão comum quando gostaríamos encontrar quem sai dessa estrutura de maneira inteligente. Existem diversos métodos de ensino que, por exemplo, procuram educar com mais enfoque na prática do que na teoria, mas geralmente estão relacionados ao ensino fundamental. O ensino superior, em contrapartida, é muito rígido em estrutura e raramente se abre para novas possibilidades. Por consequência, o ensino médio, voltado para o treinamento ao vestibular, reforça os métodos fundamentado em provas. A tecnologia – ou melhor, uso de aparelhos eletrônicos para comunicação e gestão de informação – pode facilitar trabalho de alunos e de professores de qualquer nível de ensino, contanto que seja pertinente.

– Não basta escolher jogos aleatórios e aplicar no contexto educacional.

Sim! Mas amplio: não basta escolher qualquer coisa de modo aleatório e aplicar em sala. Jogos, tecnologia, conteúdo, professores e alunos tem que estar em um estado de concordância e, se possível, sinergia. Aleatoriedade é algo que raramente cai bem em um plano de ensino. Tudo é pensado, planejado, estruturado, medido. Nem sempre dá certo, pois esse é o desafio de lidar com pessoas – elas são diferentes, e exigem cuidados particulares, algo complicado de fazer na estrutura tradicional de educação em massa. Por isso é difícil (impossível?) achar a fórmula do sucesso na educação. Já a fórmula do fracasso é mais fácil – aplique qualquer coisa, sem planejar.

– Aluno aprende se divertindo

É verdade. Aprendemos muito quando nos divertimos. Quem não gosta de assistir a um filme, ler um quadrinho, conversar com alguém engraçado e jogar um bom game? São experiências memoráveis, que algumas vezes nos lembramos por décadas a seguir. Nas suas propostas, elas nos ensinam coisas: que o Frodo carrega o um anel, o Hulk é verde e forte, o Mussum fala cacildis e o Mário faz aquele som quando pula. Por que isso não pode, então, nos ensinar outras coisas mais interessantes? Quem trabalha com formação de pessoas costuma se indagar desta forma, e procura as mais diferentes técnicas para transformar um conteúdo denso, trabalhoso e complicado (chato) em algo mais palatável. Geralmente, falham. Mas onde está o erro? Confunde-se a diversão da risada contagiante decorada de balões coloridos e pipoca doce com o envolvimento que uma situação pode promover. Um jogo de xadrez pode não ser divertido nesse sentido, mas certamente pode ser muito envolvente. Assim como um jogo da Copa do Mundo, apesar de toda tensão que promove. O psicólogo Mihaly Csikszentmihalyi, bastante estudado em game design, fala da relação entre a dificuldade do desafio oferecido e a habilidade do sujeito e que, quando isto está em equilíbrio, entra-se em um estado de fluxo (flow, no original), um estado mental de imersão total na tarefa. Conforme se realiza a tarefa, vai se ganhando habilidade nela, e a dificuldade precisa aumentar de acordo. Nosso cérebro gosta de aprender.

– Recursos tecnológicos funcionam como chamariz para esse novo perfil de aluno.

De fato, funcionam. Ao mesmo tempo, é exatamente por servirem apenas de chamariz, como uma promoção publicitária maldosa sugerindo descontos falsos, que correm o risco de fracassar. Usar a tecnologia por ela mesma cai na falha da aleatoriedade apontada anteriormente.

– Games divertem: não alienam, mas libertam a mente e enriquecem a experiência acadêmica quando utilizados da maneira adequada.

Games não alienam necessariamente, mas são uma mídia como qualquer outra. Tudo, no exagero, faz mal. Incluindo estudar e fazer exercícios, mas isso geralmente não se fala. Até sorvete demais nos entristece.

Mas concordo que muita gente enxerga o potencial educacional dos jogos. É uma ferramenta de simulação, que oferece ao jogador/ aluno um ambiente seguro para cometer erros e aprender no processo, seja por iteração (tentativa e erro) ou por estímulo do sistema de regras (prêmios, objetivos, limites impostos etc.). Pode ser um boa ferramenta educativa, se usada corretamente.


Discordo

– Ir além das metodologias tradicionais de ensino para dar significado ao processo de aprendizagem e torná-lo verdadeiramente relevante.

Não há nada necessariamente errado na metodologia tradicional de ensino. Afinal de contas, ela tradicionalmente funciona, ainda que seja bastante questionada em termos de eficiência. Procuramos métodos de aprender mais, mais rápido e de maneiras menos doloridas. Seguramente, ficar debruçado sobre um livro, por horas a fio, escrevendo resumos, destacando trechos importantes e fervilhando a mente em busca da compreensão não é nada agradável, mas funciona.

Quando estou no papel de professor, gosto que meus alunos se dediquem deste modo. Mas, quando estou do lado do aluno, também me sinto esgotado, frustrado e decepcionado com meu próprio desempenho. Estudar, desta forma, é ruim. Existem tantas outras coisas mais interessantes acontecendo no mundo, especialmente depois que conseguimos acessá-lo e simulá-lo através de um clique. E é difícil manter a concentração quando nosso cérebro parece exigir que façamos qualquer outra coisa, se não a tarefa em questão. Nossa mente gosta de novas informações, mas não gosta de trabalhar para obtê-las – a não ser que enxerguemos a recompensa, ainda que de maneira distante. Nesse caso, nós nos sujeitamos às dificuldades porque almejamos a recompensa no final. Se não há uma motivação intrínseca, não há método de ensino que enfie o conteúdo na cabeça de ninguém.

(Sobre uma discussão leve e interessante sobre jogos e o funcionamento da mente, leia KOSTER, Raph. A Theory of Fun for Game Design. Arizona: Paraglyph Press, 2005)

– Aluno aprende se divertindo

Quem não gostaria de aprender se divertindo? O argumento número um entre os jogadores de videogame é que aprenderam muito inglês jogando (afinal, é a língua mais comum nessa mídia), ou que estimula a resolução rápida de problemas e coordenação motora. Há, até, estudos científicos no campo da biologia em geral e psicologia em específico que investigam essa possibilidade. Mas, novamente, existe um problema na palavra “diversão”. Divertido é um estado momentâneo, condicional, e não uma constante. Nem os videogames são sempre divertidos. Afinal, quando se perde pela centésima vez, o jogo já não tem mais tanta graça. Mas algumas vezes insistimos, continuamos perdendo, porque o prêmio vale a pena. Uma boa discussão disto pode ser vista em “JUUL, Jesper. The Art of Failure: an essay on the pain of playing video games. Cambridge: The MIT Press, 2013”.

O que não concordo da expressão é que deixa implícito que o aluno não aprende de outra maneira. Se não há motivação para estudar, não é através do entretenimento que se resolve o problema. A diversão é apenas uma estratégia retórica, convidativa. É preciso, ao mesmo tempo, ter vontade de aprender.


Meu teste do sistema:

Em essência, trata-se de um quiz game (uma prova, com teste de perguntas e respostas), onde o aluno recebe pontos e medalhas por passar de etapas. O professor recebe feedback de pontuação da sala e outras métricas, o que pode ajuda-lo no controle da sala.

A vantagem disto está, precisamente, no sistema de feedback instantâneo, avisando ao usuário onde ele está acertando e errando. Para o professor, a vantagem de ver, por turma, as dificuldades comuns ou possíveis problemas de questões. Para o aluno, assim que dá a resposta, verifica se está errada e, no caso, qual seria a resposta correta. Isto deve diminuir bastante a ansiedade do aluno que, ao responder esse tipo de questão teste, não tem nenhum retorno sobre seu desempenho. Esta é a tecnologia sendo utilizada para auxiliar o educador.

Ao mesmo tempo, acho pouco provável que o conteúdo escolar tenha se tornado mais fácil ou divertido por conta de uma maquiagem no formato. Abaixo, uma questão do sistema:

 MUV – Acelaração escalar média:

Em um anúncio de um automóvel, afirma-se que o veículo, partindo do repouso, atinge a velocidade de 108 km/h em 8 s. Qual é a aceleração escalar média desse automóvel?

Resposta:

(  ) 2.5 m/s² (  )1 m/s² (  )3.75 m/s² (  )5 m/s² (  )3 m/s²”

Não vejo diferença do sistema tradicional de ensino, tão criticado pelo próprio desenvolvedor. Aparentemente, a expectativa de elemento diferenciador reside na distribuição de pontos e medalhas para o aluno, como se isto fosse suficiente para transformar o exercício proposto em algo divertido de resolver. A proposta deles, em suma, não é gamificar, mas é usar um eficiente sistema de feedback – o que é muito importante – aliada a uma buzz word para auxiliar na divulgação. E dá certo.

Mas então o que é Gamificar? Ao meu ver, é dar como solução um jogo para uma situação que tenha como objetivo de formar ou informar alguém – como advergames, serious games e campanhas promocionais. Isto já é feito há algum tempo, mas ainda estamos aprendendo como fazer isto direito. A escola, enquanto uma instituição com uma responsabilidade enorme – a da formação humana – procura se repensar e encontrar métodos mais eficientes para disseminar conhecimento. O processo, no entanto, não é fácil, tampouco simples.

A proposta da Playdea é um experimento que, espero, gere um bom aprendizado para a empresa e também para quem a aplica. Assim como a empresa, também vejo esse grande potencial nos jogos enquanto colaboradores em uma metodologia ativa de aprendizagem. Mas pontos e medalhas não me parecem a solução.

Bibliografia:

ADAMS, Ernest. Fundamentals of game design, second edition. Berkeley: Pearson Education, 2010
FRASCA, Gonzalo. Play the message: play, game and videogame rethoric. Agosto de 2007. 213 f. Tese (doutorado em Videogame Studies) – Dinamarca: IT University of Copenhagen, 2007. Disponível em <http://www.powerfulrobot.com/Frasca_Play_the_Message_PhD.pdf>. Último acesso em 17/06/2014.

KOSTER, Raph. A Theory of Fun for Game Design. Arizona: Paraglyph Press, 2005.
SCHELL, Jesse. The Art of Game Design: a book of lenses. Nova Iorque: CRC Press, 2008.
SHELDON. The Multiplayer Classroom: Designing Coursework as a Game, 2012
WERBACH, HUNTER. For the Win. Filadélfia; Wharton Digital Press, 2012

 


Game Marketing – Nem só de Programação vivem os Videogames!


Jogos fazem parte do nosso cotidiano: Estão nos entretendo nos aparelhos eletrônicos (VGs, PCs, mobile…), em tabuleiros e cartas e nos esportes. Mas também estão presentes na educação e treinamento corporativo, e até nas transações comerciais. Do que se trata, afinal, um programa de milhagem, se não um game que te dá pontos por consumir? E os programas de incentivo de equipes de vendas, com seus pontos e prêmios?

game-marketingChame como quiser: game design, jogos sociais, gamificação, advergames… Estamos todos preocupados com um mesmo problema: Como podemos desenvolver jogos pertinentes aos nossos consumidores? Até que ponto o público ainda é o caricato “gordinho-nerd”, e onde já podemos pensar games como um fenômeno de consumo mais amplo? E, afinal, como podemos aplicar jogos para pessoas diversas em situações que vão além do mero entretenimento?

Nem só de Progamação vivem os Videogames! Estudar jogos é entender seu mercado e uma nova linguagem em comunicação.

Portanto, é preciso discutir desenvolvimento de jogos, aprendendo as técnicas e fundamentos essenciais para tal aplicação. Mas não se trata só disto. É preciso também discutir mercado, consumidor e sociedade. Apenas assim conseguiremos refletir adequadamente sobre a aplicação de games em situações variadas. Além disso, a proliferação das redes sociais e dos aplicativos corporativos fazem da gamificação uma das grandes tendências mercadológicas da atualidade. 

Nesse contexto, negócios baseados em jogos sociais caminham para se tornarem a próxima bolha econômica. O setor vem se consolidando rapidamente no cenário comercial, e as empresas que atuam nesse campo estão se tornando organizações globais, com diversas atividades espalhadas pelo mundo, principalmente nos mercados emergentes.

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Guilherme Camargo

Foi com essa preocupação que o CEO da SIOUX digital e professor da Pós-Graduação ESPM Guilherme Camargo desenvolveu o curso Game Marketing. Trata-se de oferecer uma “melhor compreensão sobre setor de Games, apresentando-lhes as principais tendências mercadológicas como a gamificação, os jogos sociais, os advertising games e as modernas plataformas de entretenimento”, como escreve o próprio professor.

Para isso, o curso conta com convidados do mercado, figuras importantes no desenvolvimento, discussão e composição do setor nacional de jogos digitais. Entre os executivos palestrantes, edições anteriores contaram com a participação da Microsoft, Riot Games, Blizzard Entertainment e Warner Bros. Games Brasil.

Conteúdo do Curso

  • Introdução – histórico dos games: dos tempos medievais até os dias de hoje
  • Ecossistema do mercado de games: evolução, modelos de negócio e o papel de cada um.
  • Fases de um lançamento de produto: da fabricação ao consumidor final
  • Jogos/serviços – processos, precificação, evolução e impostos.
  • Evolução do mercado/segmentação/perfil demográfico
  • Gamificação – conceito e amplitude do tema
  • Comportamento do consumidor/cibercultura e games
  • Social media/social games /comunidades online
  • Game advertising/ estratégias e modelos
  • Tendências de mercado: entretenimento/jogos na nuvem/serviços
  • Papel do mercado brasileiro no segmento mundial – o que esperar para os próximos anos

Os cursos de game design são diversos, mas poucas são as ofertas direcionadas ao mercado e as possíveis aplicações. Precisamos mais destas discussões, mas já é possível ter acesso a elas também através da ESPM.

ESPM-game-marketingOnde: ESPM
End: R. Joaquim Távora, 1240 – Vila Mariana – São Paulo, SP
Quando: início dia 03/09/2014.
Incrições: Game Marketing


Quando jogar videogames se torna um emprego?


Eu costumo falar que alguns jogos se transformam, repentinamente, em um emprego. Quando o jogo *exige* que você entre em algum horário, ou quando a tarefa é super-trabalhosa e pede muito tempo para ser executada (mate 500.000 monstros) a diversão acaba – pelo menos, pra mim.

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Market Share de Clash of Clans – 2013

Clash of Clans é um desses jogos. Ele começa divertido e competitivo. Mas, conforme se joga, ele exige mais tempo de atenção do jogador, indicando momentos em que ele precisa estar presente e fazer ações, se quiser ser competitivo. Esse tipo de mecânica de jogo divide os grupos de jogadores em dois: aqueles que se cansam e desistem, ou aqueles que aceitam o desafio e persistem.

Mas o que significa “transformar o jogo em um emprego”? Está relacionada à filosofia de Huizinga sobre a diversão como uma antítese do trabalho – este “é sério”. O trabalho não diverte, porque há uma obrigação em fazer. Uma perspectiva que muitos gamificadores afirmam ser possível de alterar.

“Há uma fronteira sensível nos videogames onde o jogo deixa de ser divertido, mas insistimos na chatice porque desejamos a premiação.”

Ao meu ver, trata-se do quesito “diversão”. Há uma fronteira sensível nos videogames onde o jogo deixa de ser divertido, mas insistimos na chatice porque desejamos a premiação (seja do próprio jogo ou extrínseca a ele, como reconhecimento social, dinheiro etc.). Para Ralph Koster (Theory of Fun, Paraglyph Press, 2005), a diversão em um jogo está relacionada ao aprendizado. O jogador procura dominar o jogo, resolver seus problemas e desafios. E, quando consegue, a diversão acaba. “O destino dos jogos é se tornar chato”.

Particularmente, joguei Clash of Clans até entender a proposta do jogo. Montei a cidade, ataquei umas pessoas, que me atacaram… e é isso. Um looping infinito que dá uma promessa ao jogador: reconhecimento social através de um placar global se ele se tornar um bom jogador.

Dito isso conheça: A triste história do jogador número um de Clash of Clans

clash-of-clans-storeApós ler esta triste história, não me surpreende que o sr. Jorge Yao, que passava por momentos difíceis na vida, viu no jogo uma possibilidade de ganhar (ou ao menos simular) aquilo que na vida real lhe parecia distante.

Mas me surpreende ele precisar levar 5 iPads encapados para o chuveiro para finalmente questionar “hum, será que estou exagerando?”

Uma dica da super designer, Paula Su.
“Seja uma esponja” 


Quer estudar games? Um guia bibliográfico para o Noob em Pesquisa!


Se você já jogou Minecraft, sabe como é a sensação. Você começa o jogo e é lançado em um território estranho. Tem a noção de onde quer chegar, o que quer fazer, mas não sabe qual caminho explorar na tentativa de começar “direito”. Sente-se perdido, isolado em um território vasto. Mas é preciso dar início, então você simplesmente começa a andar. Não importa por onde comece, a sensação de que qualquer outro caminho que não o escolhido poderia ser melhor te consome. Mas, aos poucos, sente progresso. Não encontra exatamente o que procurava, mas vai dando um jeito… e de bloco em bloco, monta algo único, que não é nada parecido com o que imaginava inicialmente, mas tem um valor próprio porque foi difícil. E são as dificuldades encontradas no processo que dão a identidade única da sua construção final.

games-livros-m&gPois bem. Essa também é a vida de um pesquisador. O campo de estudos dos jogos eletrônicos é como o mapa de Minecraft, vasto, cheio de possibilidades. Cabe a você escolher os materiais que tem mais afinidade e, aos poucos, construir seu pensamento.

Diferente de Minecraft, estudos em games não tem tutorial – por enquanto. Mas há outros tipos de ajuda. Segue aqui um conjunto de livros e artigos que podem ajuda-lo a dar esses primeiros passos, mais ou menos organizados por temática.

Minha sugestão é que não leiam os livros. Pelo menos, não imediatamente. Pense em Minecraft: não saia quebrando o primeiro bloco que encontra. Explore. Utilize essa bibliografia de modo inteligente, lendo primeiro os índices, depois as introduções e as conclusões dos textos que achar mais convergentes com suas questões. Em algum momento da sua exploração, você será dominado magicamente pela sensação do “eureca!” – então mergulhe. É como achar seu primeiro diamante.

Importante: a maioria dos livros está em inglês, como notam pelos títulos. No Brasil, temos boas obras, mas ainda poucas, pois nosso campo ainda está no início do seu desenvolvimento. Esse conjunto de livros de maneira nenhuma deseja apontar que estes são os únicos livros bons por aí. Novamente, é apenas uma sugestão para primeiros passos. Quem explora é você.

Game Design
SCHELL, Jesse. The Art of Game Design: a book of lenses. Nova Iorque: CRC Press, 2008.
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A bíblia do game design. Um excelente guia de referências, inclusive de outros livros da área. É um texto de consulta, mas que tem perspectivas muito inteligentes, tanto para pesquisadores quanto para construtores de jogos.
TREFAY, Gregory. Casual game design: designing play for the gamer in all of us. Massachusetts: Elsevier, 2010.
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Boas dicas para quem quer ir direto ao ponto, pensando em jogos mais simples. Também um bom guia consultivo, sem grandes pretensões.
ADAMS, Ernest. Fundamentals of game design, second edition. Berkeley: Pearson Education, 2010
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Outra bíblia do Game Design. Adams é um desenvolvedor de jogos há muitas gerações. É amplo e tem uma linguagem bastante simples, funcional.
FULLERTON, Tracy. Game Design Workshop: a playcentric approach to creating innovative games. Burlington: Elsevier, 2008. Comprar
Também game designer, Fullerton tem uma abordagem voltada para projetos, além de explorar bem o Game Design. Um bom guia para quem quer saber como organizar seu trabalho e comercializá-lo.
BRATHWAITE, Brenda; SCHREIBER, Ian. Challenges for game designers: non-digital exercises for video game designers. Boston, Cengage Learning: 2009. Comprar Para quem já fez suas experiências em games, este livro contém diversos desafios de aprimoramento. Gosto muito da organização que ele faz de mecânicas de jogos – por isso uso ele em sala de aula!

 

Game Design e Gamification
KOSTER, Raph. A Theory of Fun for Game Design. Arizona: Paraglyph Press, 2005.
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Em fácil e rápida leitura, Koster procura explicar o que faz os jogos serem divertidos. Passa por game design, psicologia e neurociências, ainda que sem profundidade – mas o suficiente para nos fazer refletir e aprofundar, se necessário.
McGONIGAL, Jane.Reality is broken: why games make us better and how they can change the world. Nova Iorque: Penguin Press, 2011. Comprar Vista como a grande guru da gamificação, McGonigal consegue explicar game design para quem sabe muito pouco sobre game, e sobre design. Este é o seu brilho: falar sobre jogos de maneira clara, organizada, e acessível. Bem convergente com a ideia de gamificação.
WERBACH, Kevin; HUNTER, Dan. For the win: How game thinking can revolutionize your business. Filadélfia: Wharton Digital Press, 2012
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Para quem quer organizar seu próprio projeto de gamificação, o Werbach e Dan entregam boas estruturas. Recentemente o prof. Werbach deu o curso de gamificação no Coursera (https://www.coursera.org/course/gamification). Fique de olho no website para novas turmas!

 

História dos Videogames
CHIADO, Marcus V. G.. 1983: O ano dos videogames no Brasil. São Paulo: S.E., 2011.
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Marcus já foi um dos maiores colecionadores de vídeo games e computadores antigos do Brasil. Fundou fã-clubes, escreveu (e ainda escreve) em revistas especializadas, participou de reportagens e até hoje é uma figura central no salão dos entusiastas de jogos eletrônicos clássicos. Escreveu o livro baseado no material que recolheu ao longo dos anos, sendo o único livro que aborda o início dos vídeo games no Brasil. Há também sua continuação, o “1984”, igualmente excelente. Para obter uma cópia digital, é mais fácil através do autor – Marcus Vinicius Garrett Chiado – marcus.chiado@gmail.com
KENT, Steven. The Ultimate History of Video Games: From Pong to Pokémon and Beyond – The Story Behind the Craze That Touched Our Lives and Changed the World. Nova Iorque: Three Rivers Press, 2001. Comprar Se você quer saber o que aconteceu com a indústria americana de vídeo games ao longo dos anos, este é o guia definitivo. Como toda boa história, justifica bastante o atual cenário dos jogos digitais.

 

Games como instrumento de Comunicação e Educação:Abordagem Ludológica
AARSETH, Espen. Cybertext: Perspectives on Ergodic Literature. Maryland: The Johns Hopkins University Press, 1997.
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Considero este livro o ponto inicial de qualquer discussão sobre jogos como mídia. O prof. Aarseth trata os jogos digitais de uma maneira única, diferente de qualquer abordagem analítica que até então tentou-se fazer: Jogos não tem histórias, mas são máquinas de produzir histórias. De leitura densa, talvez indigesta, mas não menos importante.
 play the MessageFRASCA, Gonzalo. Play the message: play, game and videogame rethoric. Agosto de 2007. 213 f. Tese (doutorado em Videogame Studies) – Dinamarca: IT University of Copenhagen, 2007.
Download Disponível Online.
Último acesso em 17/06/2014.
– Arroz com feijão, mozzarella com azeite, goiabada com queijo branco e Cybertext de Aarseth com Play the message de Frasca: combinações perfeitas. Apesar de ser sua tese de doutorado, Frasca escreve de maneira fácil, discutindo como que os jogos digitais conseguem transmitir ideologia. Contém a mais inteligente definição de jogos que eu já encontrei. 
simulationFRASCA, Gonzalo. Simulation versus Narrative: Introduction to Ludology. Routledge: 2003.
Download Disponível Online.
Último acesso em 27 de agosto de 2014.
– Escrito antes da finalização de sua tese de doutorado, mas nem por isso menos inteligente. Se quiser descobrir porque há um certo conflito acadêmico entre as abordagens tradicionais da semiótica/ narratologia com a tentativa inovadora da filosofia ludológica, este é o começo.
JUUL, Jesper. Half-Real: Video Games between real rules and fictional worlds. Cambridge: MIT Press, 2011.
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Se já te recomendaram ler Huizinga, Caillois, Suits, Brian Sutton-Smith, Crawford, Kelley ou Zimmerman, ignore e comece por este livro de Juul (se fala iúl). Logo no primeiro capítulo, ele resume o papo e procura trazer uma abordagem nova para estas teorias “clássicas” dos jogos. Sugiro começar por aqui, para depois mergulhar em outros autores. OBS.: Não se preocupe com pertinência, pois o próprio prof. Sutton-Smith, autor de mais de 50 livros sobre jogos, emprestando honrosamente seu nome para uma biblioteca em Nova Iorque e um prêmio em excelência acadêmica, fez parte da banca de doutorado de Juul, onde ele critica a própria obra de Sutton-Smith. Juul tem culhões.

 

Games como instrumento de Comunicação e Educação: Abordagem Semiótica/Narratológica
SANTAELLA, Lúcia. Linguagens líquidas na era da mobilidade. São Paulo: Ed. Paulus, 2007
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A profa. Santaella é referência nos estudos sobre semiótica. Com um olhar interessante sobre games e novas tecnologias, pode ser um bom começo para compreender grande parte da produção acadêmica nacional.
MURRAY, Janet H. Hamlet no Holodeck: O futuro da narrativa no ciberespaço. São Paulo: UNESP, 2003
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De fácil leitura, a profa. Murray inicia a discussão da construção de narrativas através do ambiente digital – ciber dramas, como chama. Aarseth foi seu aluno, mas ele seguiu em um caminho oposto à sua professora. Até hoje debatem, de maneira respeitosa e inteligente, produção de textualidades/ narrativas em jogos digitais.

 

Jogos Digitais e Impactos Culturais
JENKINS, Henry. Fans, bloggers, and gamers: exploring participatory culture. Nova Iorque: New York University Press, 2006.
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Um bom livro de começo da discussão, escrito de maneira bastante acessível. Discute especialmente as comunidades que se formam a partir destes universos de consumo, e a formação de conteúdo a partir do receptor.
WILLIAMS, Patrick., HENDRICKS, Sean Q., WINKLER, W. Keith. Gaming as Culture: Essays on reality, identity and experience in fantasy games. : Carolina do Norte: McFarland & Company, 2006. Comprar Se você está perdido com seus estudos, livros de “conjunto de artigos” é sempre um bom começo. Bom para ver abordagens e seguir por conta própria através da bibliografia mencionada.
SANTAELLA, Lúcia; FEITOZA, Mirna. Mapa do Jogo: A diversidade cultural dos games. São Paulo: Cengage Learning, 2009.
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A versão brasileira do Gaming as Culture, citado anteriormente. Bons e inteligentes estudos para que o mais perdido dos estudantes encontre caminhos que tenha mais afinidade.
BISSELL, Tom. Extra Lives: Why video games matter. Nova Iorque, Pantheon Books: 2010.
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Quando você enjoar de papo acadêmico, pesquisas, análises e densidade teórica, e apenas quiser ver a percepção inteligente de um escritor de ficções e sua exploração através do mundo dos jogos digitais, Bissel é o nome. Bom para compreender alguns aspectos da cultura gamer.
JUUL, Jesper. A Casual Revolution: reinventing vídeo games and their players. Cambridge: MIT Press, 2010.
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Assim como Gamificação, jogos casuais é uma expressão da moda. Juul vai fundo no assunto e põe em xeque qualquer percepção que você tenha sobre quem é esse “casual gamer”.

 

– Livros Tarja Preta – Leia apenas com orientação de Professor!

HUIZINGA, Johan. Homo Ludens: O jogo como elemento da cultura. São Paulo: Perspectiva, 2007.
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Muitos de meus alunos gostam de começar por aqui. E se arrependem. Huizinga (se fala rráu-zin-rra) tem uma abordagem filosófica, densa, e orientada para a compreensão da origem cultural da humanidade, através da estrutura dos jogos como elemento formador dos rituais nas primeiras sociedades e, posteriormente, dos campos. O primeiro capítulo costuma ser o mais utilizado para quem estuda jogos digitais.
CAILLOIS, Roger. Man, play and games. Illinois: The Free Press, 2001.
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Um livro difícil de encontrar, mas muito utilizado por diversos acadêmicos. De origem francesa, a obra de Caillois (se fala cai-lô-á) procura organizar os diferentes tipos de brincadeira e de jogos, com discussões profundas, densas e nem sempre fáceis de absorver. Pra gastar o cérebro!
McLUHAN, Marshall. Os meios de comunicação como extensões do homem. São Paulo: Ed. Cultrix, 2003.
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Visto por muitos como o defensor máximo da mídia de massa, e leitura obrigatória para comunicólogos. Recomendo especialmente capítulos 1 e 24, para quem estuda jogos digitais.

 

Outras leituras relevantes
OLIVEIRA, Paulo de Salles. O que é brinquedo. 3. ed. São Paulo: Brasiliense, 2010.
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O campo da educação discute muito as diferenças entre brincar e jogar. Esse livro é para entender o debate.
SANTAELLA, Lúcia. O que é semiótica. São Paulo: Brasiliense, 2012.
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Se você não está digerindo bem as abordagens nacionais sobre jogos digitais, esse é o seu remédio.
ludificadorMASTROCOLA, Vicente. Ludificador: um guia de referências para o game designer brasileiro. São Paulo: Independente, 2012.
Download Disponível Online.
Último acesso em 30 de agosto de 2014.
Game designer e professor, fala da sua experiência na área através de um sobrevoo sobre os conceitos fundamentais sobre jogos. Mais fácil que isso é contatar o autor, conhecido como Vince Vader – vincevader@espm.br

 


Futebol não é jogo? Uma discussão sobre regras de jogos inspirada pela Copa do Mundo


A Copa do Mundo no Brasil estimula até o mais nerd dos nerds a discutir futebol. Afinal de contas, sabemos: gamer de verdade jogou pelo menos 80 horas em Skyrim, detonou GTA, discute por horas o time Pokémon perfeito e tem em World of Warcraft a sua religião – mas nunca tocou um jogo da série FIFA Soccer. A copa faz milagres.

Foi assim que iniciei uma discussão com o game designer, professor, autor, pesquisador e doutorando Vicente “Vince Vader” Mastrocola. Ao vermos o duvidoso pênalti marcado a favor da seleção brasileira logo no primeiro jogo da Copa, entendemos que o juiz é um elemento de imprevisibilidade dentro do jogo. Está lá para reforçar as regras, mas, assim como no RPG de mesa, pode interpretá-las como acha mais adequado dentro de certos limites não claramente delimitados em prol da competitividade, justiça e outros atributos subjetivos. Se as regras não são fixas, pode o futebol ser um jogo? Ou ainda, se a aplicação das regras depende da interpretação do juiz em campo, não se assemelharia o futebol mais ao RPG, por ter regras flexíveis?

Apresento essa discussão em profundidade em um texto que disponibilizo aqui, para os interessados.

Para resumir o papo, um exercício: Lembrem-se de todos os jogos digitais que já jogaram. Qual deles tem regras variáveis? Tomb Raider, Minecraft, Assassin’s Creed, Flappy Bird, Battlefield e Street Fighter podem ter múltiplos finais, estratégias, caminhos a escolher… mas todos possuem a mesma regra. Os tiros disparados pela Lara Croft causarão sempre o mesmo dano, pois seguem atributos programados pelo sistema.

Já no futebol, o juiz pode determinar se aquela despencada na área foi ou não pênalti. As regras, portanto, não são constantes, dependendo da interpretação do juiz. E agora, Arnaldo César Coelho?

Segundo a visão de Jesper Juul (2011), um dos gurus do Game Studies, e do nosso senso comum, o futebol é um jogo. Mas onde entra a “interpretação” das regras do juiz? A pergunta é importante pois não se aplica apenas ao futebol, mas a todos os jogos cuja aplicação e vigilância das regras dependem da interpretação e sensibilidade de pessoas, como esportes em geral, jogos de carta e tabuleiros, de interpretação, gamificações e quase todos outros que não são regulados por sistemas computacionais, como os videogames. Uma pergunta semelhante: caso o consumidor não siga o manual de instruções, ele está estragando o jogo?

JUUL - Classic Game Model

Vou dividir uma história pertinente. Por muito tempo joguei Monopoly da seguinte maneira: se caiu em um espaço com uma propriedade que ninguém comprou, você pode escolher se quer adquiri-la ou não. Caso não queira, ela se mantém com o banco até que algum outro jogador caia naquela mesma casa e compre-a, se por isto se decidir. Isto dificultava bastante o jogo que depende da junção de “coleções” de propriedades da mesma cor para possibilitar progresso, além da sorte nos dados, que precisava ser imensa para que um mesmo jogador conseguisse cair nos espaços desejados. 

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O tabuleiro de monopoly: os jogadores precisam ter todas as propriedades de uma determinada cor para progredir no game

Apenas recentemente descobri que há a regra do leilão, bastante clara no manual que acompanha o jogo: quando essa situação ocorre, a propriedade não volta para o banco, mas é leiloada pelo valor mínimo de $1, ganhando o jogador que pagar mais. Assim, qualquer jogador que caia naquela casa põe a propriedade em jogo, se tornando mais fácil adquirir coleções. Fiquei duplamente surpreso. Primeiro pela descoberta de que todas as injúrias proferidas aos criadores do jogo eram infundadas. Segundo, e mais importante, por termos utilizado regras alteradas e isto não ter aparentemente impactado na nossa experiência enquanto jogadores, pois vínhamos consistentemente nos divertindo com Monopoly.

Como agentes reforçadores da regra, eu e meus colegas jogadores falhamos terrivelmente. Nós não seguíamos as regras à risca e, ainda, inventávamos outras regras para suprir nossa incompetência em ler um manual com atenção. Poderíamos dizer que não estávamos jogando, pois flexibilizamos as regras? Como juízes do jogo, alteramos a regra escrita, interpretamos mal, mudamos lances… e, por isso, deixamos de jogar?

Quem apresenta tal discussão com grande maestria é o Doutor Gonzalo Frasca em sua dissertação (2007), onde procura, inicialmente, definir o que é jogar e o que é jogo – uma discussão que pode parecer tola ao senso comum já que envolvem a atividade e o objeto que são tão comuns no cotidiano, mas que possuem inúmeras interpretações e, portanto, de difícil debate acadêmico. Separar o jogo enquanto objeto (e sua estrutura formal) do ato de jogar e considerar ambos essenciais para a existência do jogo como um todo é a chave para a compreensão desta situação. Não basta uma estrutura formal, é necessário que os jogadores acreditem no jogo. Afinal, para Frasca, “jogar é subjetivo” (p.50). Isso significa que uma determinada atividade pode ou não ser jogo, dependendo, entre outros elementos, de um estado mental dos envolvidos. 

A partir de Frasca, diria que o papel do juiz, desde o princípio dos jogos, é de reforçar as regras e, mais importante, de manter coeso o envolvimento dos jogadores e espectadores com o jogo. Temos a sensação que as decisões tomadas são hora a favor do nosso time, hora do oponente – o que talvez demonstre nosso envolvimento enquanto espectadores – mas, acima de tudo, as decisões do juiz são sempre a favor do jogo enquanto um sistema de regras que exigem participação para produzir sentido. A imprevisibilidade, colocada em questão, não é um atributo particular do juiz, mas de todo o sistema do jogo. O juiz é tão culpado de ser imprevisível quanto o jogador, que pode ter cãibras ou que pode “acreditar na bola” e fazer um lance memorável.

arcade-1-arm-carVejo essa discussão muito pertinente para quem trabalha com gamificação. Afinal, como fazer com que os usuários do seu website, alunos em sala de aula e funcionários em treinamento se mantenham participativos? Como respeitar os diferentes perfis e fazer, ainda, com que todos gostem do conteúdo? Essas são dúvidas que eu possuo enquanto um profissional que trabalha com isto. Compreender que o ato de jogar é subjetivo faz-me sentir como um juiz de futebol, ou um mestre de RPG em sala de aula – não tenho um sistema computacional que faça meus alunos seguirem à risca as regras, e por isso sinto que é preciso retorcer certos limites para manter esse estado mental de participação. Uma vez quebrado, dificilmente é restaurado.

Afinal, se o problema reside na dependência da imprecisa decisão humana para o seguro prosseguir do jogo, o próprio Juul reconhece o papel da computação nesse processo. Não se trata da aplicação de câmeras nos estádios, como disse anteriormente, mas de criar sistemas computacionais que geram diferentes experiências para seus usuários – conhecidos como cibertextos (AARSETH, 1997) ou videogames. Eles mudaram a forma através da qual as regras são processadas em um jogo, pois conseguem manejar regras complexas e suas inúmeras dinâmicas de modo que seres humanos jamais conseguiriam (JUUL, 2011, p 53). Portanto, se alguém espera um jogo de futebol preciso onde as regras são aplicadas à risca e de modo matematicamente inquestionável, é melhor ligar seu PC e jogar o FIFA 14.