A Arte do Fracasso – Se sabemos que vamos perder, por que insistimos no jogo?
A visão de uma Bonfire em Dark Souls é a redenção. Depois de quase morrer diversas vezes, passar por inimigos quase impossíveis de derrotar e acumular milhares de almas, aquela pequena luz traz a tranquilidade tão sonhada. Pronto. As almas estão garantidas. Pelo menos até você se distanciar da fogueira…
Dark Souls e sua sequência são considerados jogos extremamente difíceis. São horas de gameplay compostos por inúmeras mortes do personagem. Por outro lado, é um jogo extremamente divertido e um sucesso no mercado. Se sabemos que vamos perder, por que insistimos no jogo?
Em A Arte do Fracasso, (no original The Art of Failure), Jesper Juul nos introduz o “Paradoxo do Fracasso”: nós geralmente evitamos o fracasso; nós falhamos quando jogamos video games; nós jogamos, apesar de saber que experimentaremos algo que normalmente evitamos.
Ou seja, perder faz parte do processo de jogar. E, no caso de Dark Souls, isto é ainda mais evidente: você morrerá, isto é certo, e morrerá centenas de vezes. Entretanto, a possibilidade de derrota é fundamental para a experiência, pois estimula o jogador a correr atrás, a melhorar sua performance. Obviamente, o segredo está no equilíbrio: é preciso dificultar o progresso do jogador, mas também é essencial dar-lhe a chance de se redimir.
O importante é manter a dificuldade no âmbito da habilidade humana em executar a ação. Se o sistema é o culpado pela derrota, não há nada que o jogador possa fazer para vencê-lo. Contudo, se a culpa for da inaptidão do jogador, então este ainda pode dar a volta por cima.
Jogos anteriores à década de 1980 e 1990 não eram feitos necessariamente para o jogador concluí-los. Alguém chegou ao final de River Raid? Pitfall? Ninja Gaiden? – era preciso muita paciência, vidas extras, passwords e códigos Konami para isso. Já os jogos atuais estão cada vez mais fáceis; quase todas as produções permitem que o jogador chegue ao final. É uma questão de tempo, não de habilidade.
Dark Souls, por sua vez, trouxe de volta a necessidade de se aperfeiçoar a fim de concluir os objetivos. A cada derrota, o jogador é obrigado a repensar sua estratégia. Raramente o macete de ficar batendo sem parar funciona com os chefes neste jogo (uma porrada deles e já era…). Não há dicas ao longo do gameplay, com indicações na tela de onde ir e o que fazer – não há nem um mapa… Um pequeno tutorial lhe passa os comandos e o objetivo principal e só. O resto é com o jogador.
Há pessoas mais radicais, que ainda criticam a existência do tutorial. Para elas, o aprendizado deve ser feito através de tentativa e erro. Mas não precisamos ser assim tão extremos… Pense no tutorial como uma ferramenta democrática, que permite que qualquer pessoa seja capaz de iniciar uma partida. É comercialmente benéfico e ajuda o jogador, mesmo o mais experiente, a entrar no clima e imergir no mundo do jogo. Não será isso que tornará o jogo mais ou menos fácil.
A presença de um período de aprendizado não exclui a possibilidade de derrota no jogo, apenas colabora para o conhecimento de sua lógica. A chance do fracasso, e a derrota em si, criam suspense e tensão em função da incerteza sobre o universo do jogo. E isso é fundamental para o divertimento.
The Art of Failure: An Essay on the Pain of Playing Video Games
Jesper Juul
Playful Thinking series
176 páginas
The MIT Press; 1st Edition